Juramento do Jornalista

Juro exercer a função de jornalista assumindo o compromisso com a verdade e a informação. Atuarei dentro dos princípios universais de justiça e democracia, garantindo principalmente o direito do cidadão à informação. Buscarei o aprimoramento das relações humanas e sociais,através da crítica e análise da sociedade,visando um futuro mais digno e mais justo para todos os cidadãos brasileiros.

Carta de um produtor cultural, emocionalmente flagelado

Porto Alegre, 19 de maio 2024, domingo.

Amigas e amigos:

Para dar notícias de como andam as coisas:

O RS ainda está longe de dizer que desastre ambiental passou. 

As pessoas flageladas e os animais desamparados continuarão ainda por muitos meses nos abrigos criados para as vítimas do desastre ambiental. 

Muitas cidades ainda estão debaixo d'água,  bairros inteiros desapareceram e certamente o número de mortos é maior do que este de 170 pessoas que o Estado afirma. 

Porto Alegre por ser a maior cidade do estado e sua capital, é claro que virou a vitrine principal da catástrofe. 

O Centro da cidade continua alagado, repartições públicas, agências bancárias, fosso de elevadores, fosso de escadas rolantes, garagens subterraneas, praças, restaurantes, hospitais, hotéis, quartéis, shoppings,  igrejas e sobretudo milhares de edifícios com moradores, foram alagados. 

Água e lama no térreo, no primeiro andar e não raramente no segundo andar. 

Está evidente a falência da administração pública em vários aspectos:há anos não se fazia reparações e manutenção nas comportas e nos diques que controlavam as cheias do Rio Guaíba e suas invasões de água na cidade.

Algumas roldanas e dobradiças e trilhos de correr as engrenagens das comportas, esfarelaram-se quando foram usadas.

As Casas de Bombeamento,  com dupla finalidade: abastecer as estações de tratamento de água para a distribuição de água nos bairros 

E fazer o retorno do excesso de água para dentro do próprio Rio Guaíba, não funcionaram. 

Várias com os motores elétricos estragados há 10, 12 ou 15 anos. 

Várias com vazamentos nas suas paredes, acabaram por ficar completamente submersas.

Várias que estavam em locais mais altos, não estavam com seus painéis de controle funcionando. 

Os bairros foram ficando sem água tratada que entrava nas caixas d'água  e as ruas foram se alagando de água e lama direta do Rio Guaíba. 

Tem em Porto Alegre um bairro chamado Menino Deus,  cuja avenida principal, Avenida Getúlio Vargas. é comprida e larga, tem um jacaré solto, indo de um lado para outro, funcionários do Jardim Zoológico ainda não conseguiram capturá-lo. 

Já foi até batizado: Lacoste.

Com o excesso de água do Rio Guaíba e com o excesso de chuvas, muitos bairros ficaram sem energia elétrica ou com energia elétrica intermitente. 

Tem pedaços da cidade há 15 dias sem luz.

As enxurradas, a falta de água potável, os alagamentos e a falta de energia elétrica, aconteceram e ainda estão acontecendo no dia de hoje, em mais de 30 bairros da cidade de Porto Alegre. 

O número de pessoas atingidas e prejudicadas por este estado de coisas é de aproximadamente 500.

000 pessoas.

Alguns municípios do Estado, como a cidade de Passo Fundo, mesmo com todas as adversidades presentes está realizando o seu calendário profissional cultural, para não deixar seus fazedores de Cultura do município à míngua. 

"Sirvam suas façanhas de modelo à toda terra".

O número de comerciantes,  empresários, pequenos e médios e até mesmo de grande porte, ultrapassa na capital dos gaúchos a casa de 10.000 empresários severamente prejudicados. 

Quase tão grave quanto a enchente e as enxurradas, são os crimes de roubo,  furto e depredação que os empresários estão enfrentando neste momento. 

Precisam de segurança e de estabilidade. 

Mais sinistro que as enxurradas, o alagamento das ruas, bairros e cidades e as mortes de pessoas e de animais domésticos,  mais horrível que o número de desaparecidos e de desabrigados, é a quantidade de FAKE NEWS plantadas pelos componentes do gabinete do ódio, um conjunto de tentativas nas quais os crimes e a ignorância são misturados com o intuito de tirar proveito político ideológico partidário, neste momento de luto pelos falecidos e de empenho pela vida e  do salvamento. 

É imoral e indecente que se tente atrapalhar o que está sendo feito em prol dos desastididos. 

Sabe-se que muitas das injúrias e difamações têm inclusive seu nascedor justamente nas mãos de muitos culpados pelo crime de negacionismo ambiental e burramente acreditam que mudando o foco do olhar das pessoas,  seus crimes não serão mais lembrados. 

O leque dos prejuízos é largo: vai desde a borracharia da esquina, passa por um shopping inteiro e vai até uma companhia de carros forte de transportar dinheiro, que estão todos debaixo d'água.

Quase todas as minhas atividades profissionais estão canceladas "sine die".

Meu bairro, Petrópolis, foi muito pouco machucado por tantas tristezas,  tivemos sim muitas panes de eletricidade,  a queima de vários aparelhos eletrodomésticos e eletrônicos, 8 dias sem água nas torneiras,  a necessidade de buscar num estabelecimento vizinho,  um lava-jato, que diariamente gentilmente doava 2 baldes d'água por apartamento, a chatice de subir com os baldes na escada apenas iluminada pela luz de emergência, que diga-se de passagem, são fracas.

Porto Alegre está sem Estação Rodoviária,  sem aeroporto, sem Mercado Público Central,  sem o metrô de superfície que vai desde o Mercado Público da capital do estado até o município de Novo Hamburgo.

Está rareando o  dinheiro nos caixas automáticos de bancos e de postos de combustível,  está rareando a distribuição de gás nos edifícios, os caminhões pipas com água bruta para abastecimento das caixas d'água dos prédios, hospitais, asilos, creches,  abrigos de flagelados,  quartéis, lavagem das ruas, mais do que triplicou de preço e  todo este estado de tristeza/desolação/prejuízo financeiro,  vai demorar bastante tempo ainda. 

Por volta de 6 meses podendo chegar até 10 meses em cidades como Canoas (na região metropolitana de Porto Alegre), talvez, proporcionalmente a cidade mais vitimizada no RS inteiro, que está com 150.000 pessoas realmente sem seus lares. 

Muitos bairros na capital do estado e muitas cidades do interior precisarão ser removidas de onde estavam. 

São pedaços da cidade que já se sabe que sempre estarão sujeitos às enxurradas e aos alagamentos. 

Tentar levá-los de volta para aqueles lugares é sinônimo de alimentar a indústria do acidente ecológico, da enchente e das tempestades. 

O número de abrigos para pessoas e seus animais domésticos é enorme e a quantidade de abrigos cada vez aumenta mais. 

O número de pessoas que colocou-se como voluntários é gigantesco. 

Mais impressionante ainda é ver pessoas que estão saindo de outros lugares do Brasil, gastando com suas passagens e suas demais despesas para vir até o RS para pegar no pesado, molhar-se, arriscar-se e isso tudo para salvar vidas humanas e de animais domésticos,  resgatar pessoas que estão em perigo de morte,  oferecer seu tempo,  ombro amigo e solidariedade. 

Até do estrangeiro estão vindo voluntários para por a mão na lama, na água fria e nos flagelados. 

Nunca na história do país,  exceto no período da II Guerra Mundial, as Forças Armadas do Brasil são tão queridas, admiradas e incentivadas pela população civil (da maioria dos matizes ideológicos) como agora. 

Nunca mais se deixará de olhar com sorriso e  gratidão para o Corpo de Bombeiros Militares do RS e a Defesa Civil do RS.

Tivemos problemas de segurança dentro de alojamento, um crime de estupro e crimes de abuso sexual contra meninos adolescentes. 

Tem flagelado tarado,  flagelado alcoolátra, flagelado doente. 

Na  hora de fazer o salvamento não dá pra fazer separações por categorias ou pelo dimensão de seus caráteres. 

Foi prudente a decisão do governador do RS, Eduardo Leite, de colocar segurança pública dentro dos abrigos dos resgatados. 

O crime de negacionismo ambiental está evidentemente relacionado com esta tragédia,  uma das maiores do Brasil e certamente a maior do RS. 

Há vários programas de assistência social,  de amparo financeiro para as vítimas do desastre provocado pelo crime de negacionismo ambiental,  programas de amparo que estão sendo oferecidos pelos municípios,  pelo Estado e pela União. Bilhões estão sendo liberados pelo governo federal, milhões estão sendo alocados pelo governo estadual e pelas prefeituras. 

Se muitos municípios e se o Estado tivessem investido mais em prevenção e manutenção,  da mesma forma que nós humanos temos que de vez em quando fazer o nosso "check-up" , a realidade seria menos desgraçada.

No meio de toda essa realidade com sua tristeza que será crescente, me sinto um sujeito privilegiado. 

Estou na minha casa, seco,  agora com água nas torneiras, com luz o tempo todo,  agora com Internet e até televisão,  com minha cachorra, tenho comida em casa e todos os remédios que preciso tomar todos os dias. 

Que o destino, que o Altíssimo,  que nossos mestres e guias, que nosso empenho individual, que nossa garra coletiva nos amparem e nos protejam hoje e sempre.

Autor : Plínio José Borges Mósca Professor e diretor de teatro,membro do Colegiado Setorial de Teatro do Estado do Rio Grande do Sul, Tecnólogo da Produção Cênica pela Faculdade Monteiro Lobato,  Mestre em Memória Social e Bens Culturais pela Universidade La Salle de Canoas- RS e Cavaleiro da Ordem das Artes e das Letras da República Francesa.

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